“Não há no Brasil um liberalismo econômico”, analisa Samuel Pessôa no 7º Café com Política

A live, que também contou com os economistas José Luis Oreiro e Alexandre Rocha, trouxe visões e perspectivas diversas sobre o futuro próximo da economia brasileira

 

O cenário da economia brasileira no período pós-pandemia foi o tema que norteou a live do 7º Café com Política realizada nesta segunda-feira, 29/06. Os participantes do fórum virtual idealizado pelo Sindilegis debateram a atual situação do país sob a luz do liberalismo econômico; fizeram uma avaliação sobre as alternativas de recuperação nessa área e apontaram perspectivas para o crescimento econômico após o fim da crise de coronavírus.

 

O convidado central do painel foi Samuel Pessôa, doutor em Economia pela Universidade de São Paulo (USP), pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) do Rio Janeiro e colunista do jornal Folha de São Paulo. Os debatedores convidados foram José Luiz Oreiro, doutor em Economia da Indústria e da Tecnologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e professor da Universidade de Brasília, e Alexandre Rocha, consultor Legislativo do Senado e mestre em Economia pela London School of Economics. O fórum contou com a mediação da jornalista e diretora da Secretaria de Comunicação do Senado (Secom), Érica Ceolin.

 

Em sua fala de abertura, o vice-presidente do Sindilegis Alison Souza destacou que o ministro da Economia, Paulo Guedes, é um grande defensor do liberalismo econômico. “Ano passado o ministro apresentou perspectivas interessantes sobre essa teoria econômica para o Brasil em 2020. Aí veio a pandemia e mexeu com tudo isso. Hoje temos a oportunidade de conversar sobre esse assunto. O Café com Política é um espaço criado para debater o nosso país e o desenvolvimento nacional em prol dos brasileiros”, afirmou.

 

A mediadora do debate, Erica Ceolin, destacou que o governo federal vinha defendendo o controle de gastos como medida de equilíbrio econômico, mas em decorrência da pandemia de coronavírus se viu obrigado a atuar com o capital público para garantir o sustento das pessoas que estão em casa e criar um crédito para as micro e pequenas empresas. “O endividamento público está crescendo. O governo previa 77% da dívida e agora prevê o endividamento em 100% do PIB. Diante deste cenário como fica o liberalismo econômico na volta da pandemia? É possível ir retirando essa força do governo que está sendo tão necessária agora? Como fazer isso?”, questionou.

 

A força do Estado

Para Samuel Pessôa, o país enfrenta uma situação dramática em relação ao gasto público crescente que foi agravada com a pandemia. “A pandemia é um problema de saúde pública. O Estado tem que entrar, atender as pessoas, tem que ter dinheiro para a saúde, sustentação de renda nos estados e municípios que tenham sua receita em queda. O déficit vai subir muito este ano e nós vamos ter um aumento de endividamento. Lá na frente vamos ter que voltar para uma certa normalidade, que é reconstruir para 2021 um gasto público próximo do teto de gastos. A gente vai estar com uma dívida maior, mas acho que ela só vai gerar um problema se nós nada fizermos. Se nós voltarmos com uma trajetória de ajustamento das contas públicas e com reformas que sinalizem a queda da dívida pública me parece que não há problema. O mundo pós-pandemia será de juros baixos por vários anos e com isso a economia deve voltar a crescer mais forte”, analisou.

 

Teto de gastos

José Luiz Oreiro defendeu a flexibilização do teto de gastos públicos para acelerar o crescimento da economia em 2021.  “Eu não sou contra o teto em si, mas eu defendo que se tire dele os investimentos. O investimento público é fundamental para acelerar o ritmo de crescimento, que faz com que a taxa de crescimento da economia seja maior que a taxa de juros com a qual o governo contrai empréstimos e com isso eu consigo reduzir a relação dívida pública/PIB mesmo tendo déficit primário. Isso vai ser fundamental porque a recuperação da economia não vai ser rápida. Todos os indicadores mostram que a nossa recuperação será mais lenta. Muitas empresas estão fechando porque a política de crédito para as micro e pequenas empresas tem sido horrorosa. O saldo dessa crise vai ser um número enorme de empresas falidas e isso vai se traduzir em baixo consumo e baixo investimento. A capacidade do capital de privado de puxar o investimento será pequena, logo não tem outra alternativa que não seja aumentar o investimento público”, opinou.

 

Visões ideológicas

Na avaliação de Alexandre Rocha, é essencial fugir da questão ideológica e levar em consideração os números para a retomada do setor. Segundo ele, o baixo dinamismo na economia é enfrentado pelo Brasil há muito tempo. “O problema de baixo dinamismo econômico tem muita a ver com a questão do estrangulamento das empresas. Nós tivemos no período áureo da economia brasileira mais recente, de 2004 a 2008, uma carga tributária média em torno de 33% do PIB, o que está em linha com vários países desenvolvidos e bem acima dos países parecidos com o Brasil. Se formos pensar naquilo que a sociedade brasileira gerou de riqueza anualmente a participação do Estado nessa geração marginal de riqueza vai a quase 45%. Então esse percentual de 33% não diz tudo que está acontecendo na economia brasileira. Se você for olhar quanto as empresas e as famílias estão gerando riqueza ano a ano a participação do Estado nessa geração de riqueza é substancialmente maior do que aparece no número seco da carga tributária. Isso explica a perda de rentabilidade das empresas”, explicou.

 

Perspectiva de crescimento

De acordo com Samuel Pessôa, não é possível definir uma política de crescimento da economia. “Eu tento fazer uma política para o crescimento ser maior, mas aparece a inflação. Essa foi a realidade brasileira desde sempre. A evidência, no meu entender, é que o Brasil vive uma situação permanente de excesso de demandas sobre oferta. É verdade que nos últimos três anos não foi assim – a inflação ficou abaixo da média, mas o normal da economia é uma situação de juros elevados e uma pressão inflacionária permanente. A gente voltando a crescer e reduzindo a taxa de desemprego, rapidamente volta para essa situação. Eu sou pessimista quando a capacidade de crescimento da economia e da capacidade de gestão da demanda agregada gerar crescimento acelerado”, apontou.

 

Renda básica

Em resposta a um questionamento enviado pelo chat ao vivo, José Luiz Oreiro afirmou ser contra uma política que transforme o auxílio emergencial em um programa de renda mínima permanente. “Durante o período da pandemia e até um tempo depois vai ser necessário garantir uma renda emergencial, mas a ideia de pagar para as pessoas não fazerem nada não me agrada. O que devemos garantir para a população brasileira é emprego. E emprego se gera com crescimento”, afirmou.

 

O futuro

Nas considerações finais, os participantes apontaram suas perspectivas para o novo normal da economia pós coronavírus. “Não temos segurança alguma. O ambiente é de extrema incerteza. O governo está acumulando passivos monstruosos. Isso significa dívida e obrigação de pagamento durante vários anos”, disse Alexandre.

 

“Essa ideia de que nós vamos ficar mais pobres não é verdade A crise do coronavírus não é a Segunda Guerra Mundial. Nenhuma fábrica ou usina foi destruída. Tivemos lamentavelmente milhares de mortes e essa é a grande perda para a sociedade brasileira. A dívida pública é uma moeda. A riqueza líquida da sociedade não foi alterada”, destacou Oureiro.

 

“Eu tenho um certo otimismo moderado da recuperação da economia que deve vir após o segundo trimestre. Não tem destruição física da capacidade produtiva. É uma tragédia, muita gente morreu, mas eu não acho que essa crise deixará um resultado permanente na atividade produtiva”, finalizou Samuel.

 

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