Um crítico livro aberto: é por meio da escrita de artigos e textos impessoais que o auditor Antonio Moreno consegue expelir tudo que lhe vem à mente

Por Luisa Dantas

Em 1880, Machado de Assis escreveria o livro Memórias Póstumas de Brás Cubas, cuja história é contada por um homem rico e solteiro que, depois de morto, resolve se dedicar à tarefa de narrar a própria vida. Dessa perspectiva, emite opiniões sem se preocupar com o julgamento que os vivos podem fazer dele.

Talvez não com a mesma proporção, mas a postura consistente, crítica e até mesmo polêmica de Brás Cubas em muito se assemelha ao auditor Antonio Moreno Macena de Menezes. Não é à toa que este é o livro considerado por ele como o mais marcante de sua vida. Em poucos minutos de entrevista, a fala mansa e o semblante sereno dão espaço para uma pessoa direta, sem rodeios e com um claro objetivo em mente: a busca pela verdade e pela transparência, doa a quem doer.

Aos 59 anos, Moreno é natural de Colinas (MA), mas escolheu Brasília como ponto fixo de residência aos 17. Em 1975, aos 19 anos, já fazia parte do quadro de servidores do Tribunal de Contas da União e, hoje, encontra-se lotado na Secretaria de Macroavaliação Governamental (Semag), após transitar por diversos setores da Instituição.

A paixão pela escrita vem desde cedo e não demorou para que Moreno tomasse gosto pela coisa. Apreciador de poesias, elegeu esse gênero como uma das leituras prediletas, o que acabou lhe rendendo novos espaços para exercitar a escrita. “No início deste ano, a convite do colega Júlio [Cat], comecei a escrever para o blog TCU Arte – A Arte dos Funcionários do TCU. Mas escrevo há anos para outras listas de discussões de servidores do Tribunal, como a da Auditar, e já coleciono centenas de participações por meio de artigos. Não deixo a vocação esfriar”, conta.

Quando questionado se há algum autor que o costuma influenciar no momento de colocar a escrita em prática, Moreno é enfático, como em qualquer outro momento em que precisa deixar clara sua posição: “Quem me influenciou não sei dizer, mas de admirar, com certeza, é Machado de Assis. Acho o português dele muito belo. A maneira como ele utiliza as palavras, constrói as frases e narra suas histórias é fantástica. Meu livro preferido é Memórias Póstumas de Brás Cubas – já reli várias vezes somente para rever a colocação do pensamento [do autor]”.

Da poesia à crítica – Em um dos textos disponíveis no blog do TCU, Moreno afirma que “é difícil dizer algo que nunca foi dito, mas quando algo novo se diz, isso representa uma arte”. É notável como as palavras refletem diretamente nos atos do servidor. Há alguns anos, deixou a escrita crítica de lado e abriu-se para um mundo repleto de sentimentos e voltado para emoções. Assim nascia a primeira (e até agora única) obra publicada de próprio cunho autoral, o livro “Naara”, uma homenagem pessoal e familiar à sobrinha que dá título ao livro, falecida precocemente aos 17 anos. “Tentei expressar a visão que eu tinha dela, como se fosse ela contando a própria história”, revela.

De participações, já colecionou inúmeras  frases enviadas à coluna “Desabafo”, no jornal Correio Braziliense, sempre expondo o lado que realmente pensa sobre determinado assunto, constituindo-se, como assim se denomina, um crítico contumaz das práticas desvirtuadas. “Costumam me chamar de briguento porque eu não ligo para quem vai ouvir,  sempre deixando fluir com autenticidade o  meu ponto de vista. Esse é o meu perfil, a minha essência”, analisa Moreno.

Inevitável se torna não perguntar para ele se existe a possibilidade de ser crítico, mas de maneira sutil: “Existe, mas na minha visão, perde inteiramente a graça, porque você não toca as pessoas. O bom da crítica é que posso lançar meus questionamentos para tocar a pessoa e sempre quero a resposta, porque é a partir daí que ele vai externar a visão da minha crítica, vai voltá-la para mim”.

Mas nem só de críticas vive um crítico. Ao mesmo tempo em que gosta de discutir a política e expor o que pensa, Moreno também aproveita as palavras para externar sentimentos, muitas vezes, guardados a sete chaves. “Quando você explora o lado poético, vem mais sentimento. São posições suavizadas, mas, para embelezamento literário, você busca de si mesmo algo que comova. Na crítica, o comportamento é completamente diferenciado”, comenta.

Próximos planos – Graduado em Administração e servidor do TCU desde 1975, Moreno já tem planos para se aposentar. Ainda não sabe ao certo quando, mas já tem planos traçados: escrever, escrever e escrever.

“A escrita é a forma como o homem resolveu colocar, de forma perene, o seu pensamento. É o registro, é o que há de oficial, o que vai ficar para a história. Depois da escrita, tudo tomou sentido. É fundamental para a difusão do conhecimento, da cultura, do registro do pensamento, e por aí vai. Pretendia reunir os melhores artigos que mandei para as listas de discussão e publicá-los num só volume,  mas ainda não tive tempo. Estou quase me aposentando e, presumivelmente, terei tempo de fazê-lo”, revela.

Ainda em uma de suas obras, Moreno escreve: “Arte é o que transforma, o que recria, o que renova. Afinal, a arte é tudo, posto que tudo é uma arte”. Com certeza, se estivesse vivo, Machado de Assis concordaria com essa frase e acrescentaria, como já o fez, em uma de suas citações mais famosas: “A arte de viver consiste em tirar o maior bem do maior mal”.

*Originalmente publicado no TCU em Pauta de dezembro 2015

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